Não há idade em que o bebê esteja crescendo mais rápido e formando mais conexões no cérebro do que nos primeiros 12 meses de vida. Por isso, este não é o momento de ser casual sobre como alimentar seu bebê, porque o que ele come antes de completar 1 ano importa muito.
A maneira como você alimenta o bebê fará toda a diferença em seu desenvolvimento.
Introdução focada na nutrição
Os primeiros meses são o período mais importante da vida para uma dieta rica em nutrientes que determinará o crescimento e o desenvolvimento dos bebês durante os primeiros anos de vida.
É por isso que tenho algumas ressalvas em relação à aplicação do método BLW e sugiro uma abordagem mista como opção superior, defendendo a utilização de purês, especialmente no início da introdução, bem como orientando a adoção do método BLISS no lugar do BLW.
Antes de aprofundar na adaptação muito superior ao BLW, que é o BLISS (método que recomendo) e também na questão dos purês, quero trazer alguns insights em relação às desvantagens do método BLW.
Sobre o BLW
O “Baby-Led Weaning” ou “desmame guiado pelo bebê” ganhou popularidade por promover a autonomia na alimentação, permitindo que o bebê explore e escolha os alimentos que deseja.
A idealizadora, a britânica Gill Rapley, defende a oferta de alimentos complementares em pedaços, tiras ou bastões. Sua abordagem não inclui alimentação com a colher e nenhum método de adaptação de consistência para preparar a refeição.
Só que nem tudo são flores em relação ao BLW como fazem parecer crer e algumas das minhas ressalvas em relação ao método constam abaixo para que você analise com calma e reflita a respeito de como pretende realizar a introdução alimentar do seu bebê.
Antes de mais nada, quero que você saiba que não existe o que é certo e errado, pois o mais importante será encontrar uma maneira que seja melhor para o seu bebê e também para você.
No entanto, como nutricionista materno infantil, preciso te falar sobre os pontos abaixo para você poder fazer sua escolha sabendo de todas as informações.
Algumas desvantagens do BLW são:
- Alimentos propostos 🥦
- Risco de deficiência de ferro e zinco 🍉
- Risco de engasgos 😳
- Exclusão de papinhas ou purês 🥄
- Crescimento vacilante 📉
- Aumento do desperdício de alimentos 🗑️
- Bagunça na hora comer 🧹
- O bebê decide o que quer comer 👶🏻
Apesar de alimentos de origem animal estarem presentes, eles acabam por não serem o foco das recomendações, o que pode prejudicar e muito a nutrição ideal que os bebês devem receber. É de extrema importância que os alimentos de origem animal sejam a base da dieta dos bebês, porque são ricos em nutrientes essenciais para o desenvolvimento físico e mental, como ferro, zinco, vitamina B12, proteínas de alta qualidade e ômega-3.
A deficiência desses nutrientes pode levar a problemas de saúde a curto, médio e longo prazo, como anemia, problemas de crescimento e dificuldades de aprendizado.
É importante que alimentos complementares ricos em ferro sejam introduzidos aos 6 meses de idade para manter o nível adequado de ferro. A deficiência de ferro, pode levar à anemia, que está associada a atrasos na função cognitiva que podem não ser reversíveis.
Infelizmente, os primeiros alimentos mais comuns introduzidos aos bebês no método BLW são frutas e vegetais, que são naturalmente pobres em ferro e zinco. Um status de zinco mais pobre pode ter implicações para o crescimento, desenvolvimento motor e cognitivo e na função imunológica.
O engasgo pode ocorrer facilmente em bebês aprendendo a comer, pois estão experimentando ter os alimentos na boca, mordendo e mastigando, e também têm pequenas passagens de ar. O potencial de engasgo ao seguir o BLW é uma preocupação considerável.
Um outro ponto que quero levantar é que muitas vezes o bebê pode acabar tendo que ser deixado por algumas horas com cuidadores, da família ou não e que essas pessoas podem não ter noções básicas de primeiros socorros. Ao deixar o bebê com outras pessoas, especialmente quando não há confiança em suas habilidades de primeiros socorros, pode ser mais interessante por exemplo a oferta de alimentos na forma de papinha ou purê, reduzindo o risco de acidentes.
As publicações sobre o BLW contêm ampla defesa para o uso de alimentos in natura, desencorajando a alimentação realizada na forma tradicional como papinha ou purês. Mas essa forma de apresentação dos alimentos pode ser mais difícil para bebês pequenos. Até os adultos às vezes têm dificuldade para mastigar um pedaço de carne por exemplo, que dirá um bebê de 6 meses.
Na alimentação ancestral, muitas vezes os bebês pequenos recebiam alimentos que eram previamente mastigados pela mãe. Um exemplo disso são as mães africanas que mastigavam fígado antes de darem ao bebê. Este método facilitava a ingestão do alimento e também iniciava o processo de digestão, tornando os nutrientes mais acessíveis para o sistema digestivo ainda em desenvolvimento do bebê.
No primeiro ano de vida, a maioria dos bebês recebe a maior parte de sua energia do leite materno ou fórmula. No entanto, os alimentos complementares são uma fonte importante de energia e de muitos nutrientes após 6 meses de vida.
Bebês que seguem o BLW podem ter maior risco de deficiência no crescimento, porque nem todos os bebês terão as habilidades motoras, ou motivação, para se alimentarem com a quantidade de alimentos de que necessitam, bem como pelo fato de que muitos dos primeiros alimentos oferecidos no método são de baixa energia, como frutas e vegetais.
No BLW, os bebês são encorajados a explorar e escolher os alimentos que desejam comer, o que faz que muitos alimentos acabem no chão em vez de serem consumidos.
Pegar a comida com as próprias mãos pode resultar em alimentos espalhados pela mesa, cadeira de alimentação, roupas e até mesmo cabelos do bebê. Esta situação pode exigir um esforço extra de limpeza após cada refeição, o que pode ser estressante e cansativo para os pais, especialmente os que não possuem ajuda e precisam conciliar o trabalho e outros afazeres domésticos.
No método BLW, o bebê deve ter a liberdade de decidir o que e quanto comer. Este princípio baseia-se na confiança de que o bebê é capaz de auto-regular a sua ingestão de alimentos de acordo com as suas necessidades nutricionais. No entanto, essa questão deve ser interpretada com cautela.
Embora seja importante permitir que o bebê explore os alimentos e aprenda a comer de forma autônoma, a realidade é que os bebês não têm o conhecimento ou a experiência para fazer escolhas alimentares saudáveis e equilibradas. Portanto, é fundamental que os pais ou responsáveis desempenhem um papel ativo na orientação das escolhas alimentares do bebê, garantindo que ele tenha uma dieta nutritiva que atenda às suas necessidades específicas de crescimento e desenvolvimento.
Embora o bebê e a criança possam ter preferências alimentares, é fundamental que eles sejam guiados pelos pais para o consumo de alimentos saudáveis. Os pais devem estar atentos às escolhas que os bebês estão fazendo e intervir quando necessário. Por exemplo, se notarem que o bebê não está dando a devida atenção para alimentos nutritivos como carne vermelha e fígado.
Como o leite materno tem um sabor adocicado, alguns bebês podem mostrar preferência para o consumo de frutas doces, como a banana. Se os pais aceitam que "o bebê gosta mais das frutinhas", e deixam a dieta mais compostas por frutas do que por outros alimentos de origem animal, nutrientes extremamente importantes podem ser negligenciados.
Eu pessoalmente não gosto da ideia de recomendar muitas frutas para bebês pequenos. Veja que no módulo de “alimentos recomendados” citei que as frutas devem ser vistas como “sobremesas". Os bebês estão recebendo bastante exposição ao sabor doce por meio do leite materno e, naturalmente, vão adorar as frutas. Por isso a ênfase maior deve ser em acostumá-los com sabores mais diferentes e desafiadores, à exemplo da carne vermelha e do fígado.
Minha recomendação: uma abordagem mista
Limitar um processo complexo a uma única abordagem pode não ser factível para muitas famílias, e, portanto, não pode ser endossado como forma única de alimentação infantil.
Por essas razões, sugiro uma abordagem mista, de modo que o bebê possa ser alimentado tanto por seus pais (introdução tradicional), quanto por ele mesmo (no método BLISS). Desta forma, é possível garantir que o bebê receba a nutrição adequada e ao mesmo tempo estimular sua autonomia e habilidades motoras.
Sendo assim, o bebê pode receber os alimentos amassados oferecidos na colher, mas também deve experimentar com as mãos, explorar as diferentes texturas dos alimentos como parte natural de seu aprendizado sensório motor. Deve-se estimular a interação com a comida, evoluindo de acordo com seu tempo de desenvolvimento.
Em defesa dos purês
Hoje em dia, é comum ver uma certa demonização dos purês como uma opção inferior aos alimentos inteiros. No entanto, essa visão é equivocada, especialmente quando se trata do início da introdução alimentar. Os purês são uma excelente forma de garantir que o bebê consuma e se beneficie dos alimentos, porque são mais fáceis de engolir e digerir, tornando-os uma opção segura e nutritiva para os bebês que estão começando a experimentar alimentos sólidos.
Minha opinião é que os bebê se beneficiam de uma grande variedade de texturas e consistências alimentares, incluindo purês. Até mesmo os adultos comem purês e alimentos macios, como homus, iogurte, ovos cremosos etc.
Aos 6 meses, o bebê se beneficia por exemplo de gema de ovo e fígado em purê, alimentos que ele não tem capacidade de comer completamente sozinho, exceto por pequenas quantidades que podem ser transferidas de seus dedos para a boca.
Algumas vantagens dos purês:
- Transição perfeita 🍼
- Nutrientes essenciais 🥩
- Menos bagunça 🍽️
- Segurança com outras pessoas ✅
- Aumento gradual da textura 🍲
- Preparação simples 🥄
Os purês servem como uma transição ideal de uma dieta líquida para alimentos sólidos. Sua textura suave é fácil para o sistema digestivo em desenvolvimento do bebê.
Os purês estão cheios de nutrientes essenciais que seu bebê precisa para o crescimento e desenvolvimento e fornecem uma base nutritiva para seu bebê.
Alimentar com colher definitivamente faz menos bagunça do que deixar o bebê comer sozinho e também pode reduzir o desperdício de comida.
São úteis quando a oferta será feita por outras pessoas, de modo que você se preocupe menos com o fato de que essas pessoas podem não saber lidar com uma situação de engasgo ou que possam dar os alimentos de uma forma não apropriada.
Começar pelos purês permite um aumento gradual na textura dos alimentos que pode ajudar bebês que precisam de uma introdução mais gradual aos alimentos sólidos. O bebê precisa ter contato com os pedacinhos, aos poucos, para aprender a manipulá-los na boca e a mastigar.
À medida que seu bebê fica mais confortável para engolir, você pode lentamente tornar os purês mais texturizados. Lembre-se que é importante progredir as texturas à medida que o bebê amadurece. Aos 6 meses, oferecemos a comida bem amassadinha. Entre 7 e 8 meses, amassamos um pouco menos, deixando pequenos pedacinhos. Aos 9 meses o bebê já está apto à receber alimentos muito semelhantes ao que nós adultos comemos.
Sua preparação é muito simples, basta cozinhar bem o alimento escolhido até que fique bem macio, e então amassá-lo até obter uma consistência pastosa. De modo geral, não é preciso usar mixer, peneira ou liquidificador, pois muitos alimentos podem ser amassados ou desfiados com o garfo. No entanto, para outros alimentos como a carne, pode ser interessante liquidificar ou processar para atingir a textura de purê, principalmente no início da introdução, se notar dificuldade do bebê em aceitar a carne em outra consistência, pois o mais importante é que o bebê coma a carne e receba seus nutrientes.
O melhor dos dois mundos
Embora os purês sejam uma forma muito útil, especialmente para iniciar a introdução alimentar, acredito que podemos tentar obter o "melhor dos dois mundos" ao unir a oferta dos purês com as recomendações do método BLISS.
Por exemplo, algumas refeições podem ser servidas pelos pais aos bebês em purês, enquanto outras podem ser guiadas pelo bebê. Desta forma, garantimos que o bebê receba a nutrição necessária e, ao mesmo tempo, incentivamos sua autonomia e desenvolvimento motor.
Uma forma de aplicar isso no dia a dia seria por exemplo reservar a oferta de purês em momentos em que você estiver mais cansado, sem tempo para limpar a bagunça que o bebê faz com a comida, ocasiões em que o bebê fica aos cuidados de terceiros, quando percebe que o bebê está encontrando dificuldades de se alimentar etc. Já em outros momentos se dedicar à deixar o bebê tentar conduzir sozinho sua refeição, mas seguindo as recomendações dietéticas do método BLISS, que nutricionalmente é mais interessante do que o BLW.
E podemos aplicar também aos purês as recomendações principais do BLISS no sentido da oferta de um alimento rico em ferro e em calorias a cada refeição.
No mais, à medida que o bebê amadurece e se torna mais independente, é possível ir abandonando os purês para se concentrar apenas no método BLISS.
Sobre o BLISS
Assumindo os grandes questionamentos dos pais e dos profissionais de saúde relativos ao BLW, como risco de engasgo, e de baixa oferta de ferro e de calorias, um grupo de estudiosos neozelandeses, criou uma versão chamada Baby-Led Introduction to SolidS (BLISS), que significa Introdução aos Sólidos Guiada pelo Bebê.
A grande diferença entre o BLW e o BLISS é a seleção dos alimentos ofertados ao bebê, sendo que o BLISS possui uma preocupação com a quantidade de calorias e ferro ingeridos, recomendando portanto que o prato contenha um alimento de alto teor energético e um alimento rico em ferro e também que sejam evitados alimentos com alto risco de engasgo como: Hortaliças cruas, Verduras cruas, Folhas de salada, Maçã crua, Nozes inteiras, Frutas secas (ou passas), Cereja, Tomate cereja, Uva, Ervilha, Milho, Bolachas de arroz, Pão, Miolo de pão, Espinha de peixe, Alimentos que não são amassados quando pressionados contra o céu da boca e Alimentos que quando amassados, ficam aderidos ao céu da boca.
O BLISS visa portanto, aumentar a ingestão de alimentos ricos em ferro, reduzir o risco de crescimento deficiente como resultado da baixa energia da autoalimentação e reduzir o risco de asfixia.
Em relação à segurança, as recomendações do BLISS são:
- Ofereça alimentos que o bebê possa pegar e se alimentar sozinho.
- Nunca coloque alimentos na boca do bebê – ele deve fazer isso em seu próprio ritmo e sob seu próprio controle.
- Ofereça alimentos preparados de forma adequada à idade de desenvolvimento do bebê para reduzir o risco de engasgo e evite oferecer alimentos listados como de alto risco de engasgo.
- Evite alimentos que formam migalhas na boca, alimentos duros, alimentos alimentos secos, pequenos e alimentos em formato circular (moeda).
- Teste os alimentos antes de serem oferecidos para garantir que sejam macios o suficiente para serem amassados com a língua no céu da boca (ou sejam grandes e fibrosos o suficiente para que pequenos pedaços não se quebrem quando sugados e mastigados, por exemplo, tiras de carne).
- Certifique-se de que o bebê esteja sempre sentado ereto quando estiver comendo – nunca inclinado para trás.
- Tenha sempre um adulto com a criança quando ela estiver comendo.
- Pratique a alimentação responsiva, garantindo que: o ambiente de alimentação seja agradável, com poucas distrações (por exemplo, sem televisão), os cuidadores prestem atenção aos sinais de fome e saciedade do bebê e que os cuidadores respondam ao bebê prontamente e com apoio.
Já no que diz respeito à dieta e aos alimentos, as recomendações são:
- É aconselhável iniciar a alimentação complementar aos 6 meses de idade (ou seja, não adiar além de 180 dias).
- Os pais devem ser incentivados a oferecer 3 tipos de alimentos em cada refeição.
- Um alimento rico em ferro 🥩
- Um alimento rico em energia 🥔
- Um alimento como uma fruta ou vegetais 🍓
- Oferecer alimentos "fáceis" e mamadas mais frequentes com leite quando o bebê estiver doente e durante a recuperação.
- Ao elaborar receitas, haver ênfase para receitas ricas em ferro (ex: carne vermelha, fígado) e receitas ricas em energia.
Como carne, frango, peixe, cordeiro, porco, fígado e de origem vegetal como feijão, lentilhas, grão de bico.
Mais de 1,5 kcal/g, por exemplo, abacate, banana, queijo, manteiga, azeite de oliva, abóbora, batata, batata doce etc.
Frutas ou vegetais menos calóricos, mas com baixo teor de energia, como o morango ou brócolis.
Vantagens do BLISS
O método BLISS se propõe à corrigir os potenciais efeitos negativos do BLW, prevenir a deficiência de ferro e minimizar qualquer risco de engasgo/asfixia (menor risco devido à atenção extra à textura e ao formato dos alimentos) ou falha no crescimento.
Os bebês nascem com ferro armazenado em seus corpos, mas como crescem rapidamente, bebês e crianças pequenas precisam absorver muito ferro todos os dias. A anemia por deficiência de ferro afeta mais comumente bebês de 6 a 24 meses de idade.
A deficiência de ferro que progride para anemia ferropriva pode ter impacto no sistema nervoso central e no desenvolvimento durante a infância, levando a um desempenho cognitivo e comportamental mais fraco. Além disso, esses impactos no desenvolvimento infantil podem não ser reversíveis.
Por isso, entendo que a proposta do BLISS é superior à do BLW, eis que incentiva que os alimentos ricos em ferro estejam presentes em todas as refeições. O fato de que o método BLISS reforça a importância da dieta do bebê conter um alimento rico em energia também é bem interessante.
As necessidades energéticas relativamente altas de bebês e crianças pequenas, juntamente com sua capacidade estomacal limitada, desafiam sua capacidade de atender às necessidades energéticas fisiológicas, principalmente se a densidade energética da dieta for baixa.
O bebê está em acelerado crescimento e caso os pais acabem ofertando mais de alimentos pouco calóricos como frutas e vegetais, não há muito que o bebê possa extrair desses alimentos em termos de calorias. A proposta de conscientizar os pais que a dieta precisa trazer energia suficiente torna o método mais completo que o BLW, onde vemos que a dieta fica muito focada em frutas e vegetais.
Por fim, o método BLISS coloca frutas e vegetais em seu devido lugar, ou seja, como alimentos secundários, complementares. Isso inclusive está em concordância com a abordagem de dieta baseada em animais que tanto defendo.